Segunda-feira, Fevereiro 18, 2008

Monólogo

Click here for English


Passei com o meu carro por lá e estava uma confusão. Olhei curiosa e você me viu. Eu continuei devagar, você saiu do meio da multidão com o braço para cima gritando meu nome. Não parecia verdade, mas você gritou meu nome outra vez, me pediu para parar. Eu parei em fila dupla, outros carros me xingando e buzinando, mas não tinha o que fazer. Se eu desse a volta na quadra talvez perdesse você… Não! Nem pensei em andar mais dez metros. Quando vi seu braço esticado, seu pescoço tentando crescer para me ver, sua voz gritando meu nome…eu parei. Só parei.
Não olhei para trás. -- nem para os carros, nem para você. Tive medo de me mexer. Olhei pelo retrovisor externo e vi você afastando a multidão com os braços, se esgueirando para passar entre as pessoas. Meu coração bateu forte. Um frio na barriga. Medo. Muito medo. Por que você estava aqui? E você veio chegando, as pessoas tentando entender onde você ia, aqueles homens querendo evitar que elas seguissem você, queriam levar você de volta para dentro…e você chegando. Quando você parou na porta do carro, eu não olhei para fora. Fiquei como estava, olhar fixo no espelho que já não mostrava nada, meu coração pulando, meu estômago virando, fechei os olhos como se esperasse a pedra que vinha bater na testa. Você bateu no vidro. Eu apertei o botão e virei o rosto na sua direção com medo que meu coração pulasse e sujasse a sua roupa. A sua roupa. Uma manga longa por baixo da outra curta. E por dentro você vestia um sorriso que ofuscava toda a rua. O ritmo dos meus batimentos cardíacos mudou quando encontrei seus olhos. Parou. Três segundos de morte e eu precisei sorrir. Você perguntou onde eu estava indo. Eu disse que não sabia. “Não sei mais, não lembro, e você? Onde você estava indo que veio parar aqui?” Você abriu a porta do carro, levantou a mão e fez sinal para alguém que eu não vi, mas que entrou no meu carro assim que eu saí. Você mandou guardar o carro e disse no meu ouvido que eu não ia a lugar nenhum e nem você. Eu estava atordoada com toda aquela gente, e não conseguia entender a sua presença, tão perto, sem eu saber, sem me avisar. Era como um sonho ou uma alucinação, mas sonho não segura o braço da gente, e você me puxava pelo braço me levando sei lá pra onde. Passamos no meio de toda aquela gente e elas perguntavam umas às outras quem eu era sem ninguém responder, nem eu, porque eu não sabia mais. Só sabia que você estava ali, jeans, camiseta e a outra, e um sorriso que ofuscava todo o bairro, e aqueles olhos felizes me olhando. Você me puxou correndo e me levou para o elevador, apertou o botão que fecha a porta três vezes, quatro, cinco e a porta fechou quando a multidão chegava. Você suspirou aliviado fechando os olhos e, sem abrí-los, me abraçou sem dizer nada de um jeito de quem queria muito um abrigo, mas fui eu quem se abrigou no seu peito, as costas escondidas entre os seus braços, e sua boca beijando o meu cabelo. Eu não disse nada. Não podia. Minha voz não sairia e nem saberia o que dizer. Você ficou assim até o elevador parar no décimo andar e só me largou quando a porta abriu. Você me puxou de novo, segurando meu braço e minhas costas, me guiando pelo corredor que eu não sabia onde ia dar. Eu olhei para você, tão alto, que me sorriu outra vez e parou me olhando. Era o meio do corredor do décimo andar e eu não sabia porque estava ali, ou você, sem eu saber, sem me avisar…Você disse que eu sou melhor ao vivo e eu disse que você também não é mal, você sorriu dentro de mim de um jeito que eu não sei explicar e ofuscou toda a cidade. Você me abraçou de novo mas antes que eu pudesse me encaixar no seu peito, me levantou no colo e continuou andando pelo corredor do décimo andar me beijando enquanto andava, enquanto meu coração parava. Eu não disse nada, porque não sabia como tudo isso estava acontecendo se eu estava acordada e não estava sozinha, porque não tive tempo desde que parei o carro para sonhar por um minuto. Você abriu a porta e eu vi as malas fechadas. Deduzi que você acabara de chegar e comecei a entender porque eu não sabia. Eu também não avisaria; chegaria e pegaria o telefone pra dizer “hey! O que você vai fazer daqui há meia hora?” Aí contaria que estou aqui, que vim te ver, que não podia deixar você sonhar comigo acordado para sempre assim, no vácuo dos pensamentos. E quando você me devolveu ao chão, eu vi tudo rodar e você me segurou, perguntou se eu estava bem e me beijou de novo. Me sentou na poltrona, parou na minha frente, sorriu com os olhos bem dentro dos meus, e disse tudo o que eu tinha pensado. Que você ia me ligar, que só veio para me ver, que não podia mais ficar assim, no vácuo dos pensamentos. Disse que não quis me avisar com medo que eu fugisse. “Fugir? De você?” Você estava mesmo no vácuo de alguma coisa, senão saberia que eu não poderia fugir. Você segurou minhas mãos e eu lembrei que queria as suas. Segurei as duas para mim e olhei os seus três anéis. Agora fui eu quem sorriu dentro de você e ofuscou todo o planeta. Eu beijei as suas mãos por existirem e você entendeu o que eu quis dizer.
Deixa eu mentir para mim? Deixa eu achar que estou acordada e não estou sozinha e que o seu sorriso está aqui ofuscando todo o universo.


1 Comentários:

Blogger Alice Salles disse...

E porque não continuou?
ai...
"Agora fui eu quem sorriu dentro de você e ofuscou todo o planeta. Eu beijei as suas mãos por existirem e você entendeu o que eu quis dizer."
Ai que lindo isso tudo...
mil beijos mer

7:52 PM, Fevereiro 19, 2008  

Postar um comentário

Links para esta postagem:

Criar um link

<< Início