Terça-feira, Julho 22, 2008

Sobre amor, beleza e outras manias...


Eu lembro de ser bem pequena, de saia curta, sapato de verniz branco, meia três quartos, e sonhar com o dia que eu seria Miss Brasil. Lembro de querer ser bonita muito mais que todas as outras coisas que as pessoas queriam. Lembro que nunca me vi como os outros me vêm. Nunca tão brilhante. Nunca tão bonita.
Eu não quis ser nada importante, na verdade quis muito poucas coisas e ser alguma coisa me assustava como boa libriana: "hey! mas eu vou ter que escolher?" Como sempre fui incapaz disso, a vida foi me levando...eu já falei sobre isso por aqui e não quero me repetir...só quero chegar ao ponto: eu não quis nada, eu tive tudo, mas a desgraça da beleza nunca deixou de me assombrar. E o tempo passa... e o tempo é cruel - o tempo, a gravidade, a gravidez...
O culto ao intelecto do meu tempo, fez com que achássemos que o corpo era só um meio de transporte para o cérebro, nos matando mais cedo, nos trazendo marcas precoces, nos detonando aos poucos (e aos montes). Fumamos tudo e bebemos todas para conseguir filosofar mais claramente, ter mais talento, ser mais interessantes. Alguns de nós ainda resgataram a saúde a tempo, sem achar feio, sem achar que ficariam mais burros ou menos dignos. Outros não. E aí houve uma inversão tão perigosa quanto a primeira: minha geração cuidou demais do corpo, se plastificou, se encheu de botox, ficou neurótica, e era a academia ou a depressão, o personal ou o sentimento de abandono, a seringa ou o medo de ser mais velho do que todos os seus iguais. Enquanto os sedentários criticavam e viam a diabete e o colesterol chegarem, os novos atletas pareciam se conservar em formol.
A minha geração correu atrás de uma aparência impossível, porque não inventaram nada para trazer de volta a pele dos vinte anos. Preenche-se tudo, mas perde-se a identidade. Troca-se tudo...peito por silicone, ruga por restyline e botox, pernas finas e bundas chatas por próteses, maridos por meninos, esposas por modelos, famílias por aventuras.
E eu tenho medo de descobrir mais tarde que toda uma geração se perdeu ao perder a maturidade, por achar que a adolescência não precisava passar. Medo que todo mundo se olhe no espelho daqui há um tempo e descubra que está disforme, irreconhecível, e...sinto muito...ainda assim, velho!

Já bem tarde na vida, encontrei um homem cinco anos mais novo do que eu. Vampira que sou, guardei ele para mim, garantindo a porção de juventude que podia me faltar um dia. E nós crescemos juntos. Ao lado dele eu virei uma matrona várias vezes. Ao lado dele eu cheguei aos quase 90 quilos. Ao lado dele eu jamais escutei uma crítica referente ao meu corpo ou às marcas do tempo. Se saí correndo para malhar, para fazer regime, para fazer uma lipo, para fazer um laser, foi sem que ele jamais sugerisse nada. Aí...no fim desse meu regime enlouquecido, em que já dei adeus a quase todos os quilos a mais, eu olho para ele e percebo que para ele tanto faz. É a mim que ele ama! Ele não quer saber se eu tenho músculos ou flacidez, se minha pele tem manchas, rugas, celulite...ele quer saber se eu estou feliz. Ele está envelhecendo ao meu lado e a história de vida que temos é muito mais valiosa do que uma injeção de botox que vai durar no máximo quatro meses. Ele sabe que olhar no espelho e gostar de mim mesma me faz feliz, mas isso só serve para ele apoiar as minhas loucuras, e seguir sorrindo, porque para ele, seja velha ajeitadinha ou velha carcomida, o importante é que eu esteja lá.
Um amigo me disse outro dia que as mulheres não têm idéia do quanto são lindas aos cinquenta anos...veja só...quem diria? Quem sabe ele nem é louco. Quem sabe nós, mulheres, é que exigimos demais de nós mesmas. Ao ver aquele cartão no Post Secret desse Domingo, me lembrei do meu amigo, e do meu marido, e do quanto o tempo passou...o quanto ele deixou marcas, e o quanto o tempo faz parte de mim...e eu dele.

Então eu quis ser miss, eu quis ser musa e esse querer não tem, no fim das contas, nada a ver com beleza. Mas eu, boba, não sabia.



Um beijo amigo no seu umbigo.


PostSecret é aqui.

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Quarta-feira, Junho 11, 2008

Coisas da Vida #6


Era muito óbvio que ela não era normal. Tinha um par de olhos brilhantes que, na verdade, brilhavam muito mais do deviam e isso, logicamente, não podia ser normal. Pessoas são felizes, mas são felizes dentro de um limite concebível e não tão descontroladamente que possam andar por aí com os olhos brilhando em todas as ocasiões, como se fosse uma roupa, um brinco, um par de sapatos. Até mesmo um par de sapatos tem a ocasião certa para ser usado.

E de onde então poderia vir aquele brilho? Pois pasmem...dos olhos. Sim, dos próprios olhos e de sua habilidade de enxergar o mundo de uma forma que só ela enxergava. O mundo? Vamos falar a verdade: os habitantes do mundo! Nunca, um só dia da longa existência que lhe foi dada, ela manteve os olhos fixos em uma pessoa só. Nem mesmo no maior amor de sua vida. Seus olhos sempre buscaram outras paisagens, outros olhos, outros corpos para desejar, outras bocas para sonhar. E era esse o brilho aviltante, ultrajante, revoltante, que ela tinha no olhar.

Seus alvos não eram escolhidos com um critério. "Éramos olharmo-nos intacta retina" ... e pronto. Era juntar olhar com olhar, e dependendo de como aqueles olhos brilhavam, a escolha estava feita. O estranho é que nenhuma palavra era dita; nenhum gesto mais óbvio; era aquele olhar e fim, como se impressões digitais se encaixassem, num episódio de CSI. "Você é meu alvo", "Eu quero ser". E dali começava um jogo de sedução nem sempre bem sucedido, mas que sempre alimentou o brilho ousado daqueles olhos incríveis.

Foi assim que ele foi escolhido. Ah, mas como ela quis que tivesse sido ao contrário... Pela primeira vez, ela quis ser a presa hipnotizada, fascinada pelo olhar do predador. Predador menino aquele, que aparentemente não oferecia risco, mas exalava perigo pelos poros da pele morena que cobria o corpo perfeito.
Ali estava ele, exposto sem saber, como a promessa de sonho longo e de castigo cruel. Desejo que não brilha, mas lateja. Uma história sem fim e sem meio, mas cheia de palavras de intenção duvidosa. The ultimate conquer! O mais flamejante dos troféus. Mas não aconteceu. Ela perdeu a batalha, acabou desistindo, seus olhos encontraram outro alvo e fim.

Passaram-se os anos, nem mais uma palavra sobre o troféu flamejante, mas alguns alvos são eternos, ou se invertem, ou a vida gosta mesmo de brincar com as pessoas.
E lá vem ele de novo, com seus poros todos, exibindo no olhar um brilho maior do que o dela.
Já não era mais menino...já tinha outro modo de olhar. E foi assim que ela foi a presa. e ele, o predador. Ela o troféu. Ele o vencedor.
Alguns desejos nunca se vão. Eles só ficam guardados para o dia certo, para a hora exata que chegou.
Ela tinha um par de olhos brilhantes que, na verdade, brilhavam muito mais do deviam. Agora mais.



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